Poemas, Poesias, Contos e Crônicas

Friday, September 22, 2006

- Florbela Spanca -






Inconstância
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Procurei o amor, que me mentiu
Pedi a vida mais do que ela dava;
Eterna sonhadora edificava
Meu castelo de luz que me caiu!
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Tanto clarão nas trevas refulgiu,
E tanto beijo a boca me queimava!
E era o sol que os longes deslumbrava
Igual a tanto sol que me fugiu!
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Passei a vida a amar e a esquecer...
Atrás do sol dum dia outro a aquecer
As brumas dos atalhos por onde ando...
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E este amor que assim me vai fugindo
É igual a outro amor, que vai surgindo,
Que há de partir... nem eu sei quando...
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- Florbela Spanca -

Thursday, September 21, 2006

Caio Fernando de Abreu

"Não é saudade,
porque para mim a vida é dinâmica
e nunca lamento o que se perdeu
- mas é sem dúvida uma sensação muito clara
de que a vida escorre talvez rápida demais
e, a cada momento, t
udo se perde"
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"Sabe,
eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende?"
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- Caio Fernando de Abreu -

Sunday, September 17, 2006

Terceira Perna


"Perdi alguma coisa que me era essencial,
e que já não me é mais.
Não me é necessária,
assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna
que até então me impossibilitava de andar
mas que fazia de mim um tripe estável.
Essa terceira perna eu perdi.
E voltei a ser uma pessoa que nunca fui.
Voltei a ter o que nunca tive: apenas as duas pernas.
Sei que somente com duas pernas é que posso caminhar.
Mas a ausência inútil da terceira me faz falta e me assusta,
era ela que fazia de mim uma coisa encontrável por mim mesma,
e sem sequer precisar me procurar."
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- Clarice Linspector -

Saturday, September 16, 2006

Amar amar amar ...


Amar
- Florbela Spanca -
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Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
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Recordar? Esquecer? Indiferente!
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
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Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu a voz, foi pra cantar!
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E se um dia hei de ser pó, cinza e nada,
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que saiba me perder... pra me encontrar...

... Esquecimento ...

ESQUECIMENTO
-Florbela Spanca -
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.

Tudo em redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tateio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!

Descem em mim poentes de Novembro...
A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...

E desse que era eu meu já me não lembro...
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!

Friday, September 15, 2006


“Minha mulher, a solidão,
Consegue que eu não seja triste.
Ah, que bom é o coração
Ter este bem que não existe!
Recolho a não ouvir ninguém,
Não sofro o insulto de um carinho
E falo alto sem que haja alguém:
Nascem-me os versos do caminho.”
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- Fernando Pessoa -

Tuesday, September 12, 2006

... Sossega, coração ...

Sossega, coração! Não desesperes!
Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.
Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo!
Pobre esperança a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!
Sossega, coração, contudo! Dorme!
O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme.
A grande, universal, solene pausa
Antes que tudo em tudo se transforme.
Sossega coração e adormeça !

- Fernando Pessoa -

Sonho ...


"Sonho. Não sei quem sou neste momento.
Durmo sentindo-me. Na hora calma
Meu pensamento esquece o pensamento,
Minha alma não tem alma.

Se existo é um erro eu o saber. Se acordo
Parece que erro. Sinto que não sei.
Nada quero nem tenho nem recordo.

Não tenho ser nem lei.
Lapso da consciência entre ilusões,
Fantasmas me limitam e me contêm.
Dorme insciente de alheios corações,

Coração de ninguém."
- Fernando Pessoa -

O amor é uma companhia

"O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo. Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar. "

- Fernando Pessoa -

Tuesday, September 05, 2006

... BORBOLETAS ...

"Com o tempo,
você vai percebendo
que para ser feliz com uma outra pessoa,
você precisa,
em primeiro lugar,
não precisar dela.
Percebe também
que aquele alguém que você ama
(ou acha que ama)
e que não quer nada com você,
definitivamente
não é o alguém da sua vida.
Você aprende a gostar de você,
a cuidar de você
e, principalmente,
a gostar de quem também gosta de você.
O segredo é não correr atrás das borboletas...
é cuidar do jardim para que elas venham até você.
No final das contas,
você vai achar não quem você estava procurando,
mas quem estava procurando por você!"
- Mário Quintana -